terça-feira, 26 de abril de 2011

A guerra do queijo

JORNAL DA MANHÃ - ARTICULISTAS - João Gilberto Rodrigues da Cunha - 02/03/2011

     Escolher assunto para crônica obrigatória é fogo. Acontece que são tantos os acontecimentos semanais que a dúvida está sempre no que, qual ou quem. Vejam que aí estão o Carnaval, os horrores do Khadafi na Líbia, os re-reinvasores de terras na roça brasileira – tudo fácil de enfrentar. Acontece que, pensando, reli a invasão fiscal sobre os queijos dos nossos lojistas no Mercado. Não sei se isto aconteceu somente nesta Uberaba – ou se foi uma geral ordenada pelas estruturas da nossa saúde pública. Vou citar o episódio aqui em Uberaba, que todos conheceram. 
     Simples: uns agentes fiscais entram vistosos e poderosos, desnudam as lojas pequenas e simples, tomam-lhes os queijos que não apresentam carimbo de licença fiscal por falta de higiene da saúde pública… e desandam uma esculhambação primitiva sobre vendedores simples e tradicionais no estilo do toma na marra, se necessário pontapés em queijos teimosos que vão para o chão. Coisa simples, para eles, que carregam e encarnam a lei: devem ter ido para casa felizes, quem sabe, esperando uma medalha pela sua coragem e atividade. Cai o pano, terminou o ato. Eu – e comigo muito outros – ficamos desajeitados, querendo perguntar coisas. 
    Por exemplo: era necessário o escândalo sobre questão tão pobre e gente tão simples, honesta e que no mercado ganham a sua pobre vida? Ou era mesmo para fazer teatro, intimidar os coitados e seus fregueses do queijo tradição no Brasil? Vou adiante: muita gente neste Brasil – eu no meio – cresceu comendo este queijo que chamamos mineiro e é propaganda gustativa da nossa terra. Cheguei aos oitenta em parte comendo partes de uns 800 queijos. Nunca tive doença – nem mínima diarreia – que pudesse levar a culpa queijosa. 
     Ponto dois, bem brasileiro: a pureza e a qualidade estão asseguradas por um carimbo. Ora, isto é Brasil, meus amigos, terra dos carimbos verdadeiros, falsificados, de favor ou apenas de recolhimento tributário. Desconfio – sou mineiro! – que uma parte da patrulha sanitária representa aquela história governamental: o Brasil progride, tantos mil empregos novos foram criados – e penso: criados para produzir a riqueza nacional ou apenas para colocar afilhados e gentes desocupadas? Não se ofendam os agentes fiscais, estão cumprindo ordens que lhes deram.
     Apenas, e com meu senso profissional: aqueles queijos criminosos e destroçados: não mereceriam um exame por amostragem, inclusive para prova e conhecimento daqueles que como eu “queimam” na frigideira aquele nosso sabor e saudade da infância. Outra besteira, vão pensar: fermentos e bacilos são essenciais para os caríssimos queijos europeus, Espanha, Portugal, França e tudo mais. Aqui batem o cacete sem nos contar e provar quais são os venenos do nosso mineiro calado, obediente e pobre. Não vai morrer, afinal, isto é Brasil. 
     Alguns organizados e ricos vão bater o selo de pureza e ganhar dinheiro. Nós outros, em produção artesanal, vamos comer escondido, nas chácaras, sítios e fazendas. Ninguém vai morrer nesta guerra, bem ao estilo brasileiro. Os pobres pagarão menos, os ricos mais – isto é justo. Apenas, e de forma dolorosa e brasileira: por que a lei aqui não vem calçada e explicada? Por que bater primeiro, e sempre nos mais fracos? Gosto de exemplar: o Orides Simeão, que nesta semana fez 102 anos, foi nosso gerente de fazenda doidão por leite e queijo do rio do Peixe até hoje. O que está errado, o Orides ou o queijo? Ou os outros?…
(*)  médico e pecuarista

Matéria completa no link: http://www.jmonline.com.br/novo/?noticias,22,ARTICULISTAS,42110

Um comentário:

Mais Informado disse...

É um absurdo a legislação do nosso país. O SIF é uma verdadeira velharia burocrática, não ajuda em nada os verdadeiros queijos, os que fazem bem de verdade a nossa saúde. Um queijo que tem o selo do IMA ou do SIM, deveria ter direito de ser vendido em todo o país, pois como um país pode aceitar que um determinado queijo seja bom para uma região e não permitir que seja vendido em outras?